terça-feira, 4 de outubro de 2022

PAREDES DA VITÓRIA


HISTÓRIA – LENDAS - E OS MOINHOS DE ÁGUA


O Vale das Paredes é um autêntico “boqueirão”, profundo e encaixado tendo um comprimento aproximado de 2.400 m. É estreito na maior parte do seu percurso, abrindo-se junto ao mar numa planície aluvial extremamente fértil, com uma largura entre os 70 e os 140 metros e um comprimento superior aos 350 metros na parte final da ribeira do largo vale cultivado.
Sobre a ocupação da orla costeira, com particularidade do lugar das Paredes, há uma descrição datada de entre os séculos I a.C. e I d.C., em que se aborda a identificação de uma estrada romana da Carreirancha, em Alqueidão da Serra, e que faria a ligação entre Tomar e o porto de Paredes (Paredes da Vitória), Collipo (Leiria) e Conimbriga (Condeixa).
D. Dinis atribuiu o primeiro foral às Paredes em 17 de Dezembro de 1282 numa perspectiva de incentivo ao povoamento. Este primeiro foral era uma carta de povoação para 30 moradores, obrigados a terem seis caravelas, pelo menos, preparadas para a pescaria e para defenderem este sítio da costa, das invasões dos piratas Africanos e Granadinos. O mesmo D. Dinis concedeu um segundo foral em 29 de Setembro de 1286 e, D. Manuel I concedeu um outro e último em 1 de Outubro de 1514.



Por volta do ano de 1340, a vila das Paredes tinha cerca de 348 habitantes e, em 1368, a vila foi doada ao Mosteiro de Alcobaça, a mando do rei D. Fernando, com o propósito das suas rendas recaírem para a salvação da alma de seu pai, D. Pedro I, que jaz nesse Mosteiro.
Durante muitos anos deu-se uma progressão do porto das Paredes, onde chegou a atingir 600 fogos e a possuir um forte e 17 caravelas para a defesa do seu porto.
O fim do porto das Paredes esteve associado ao seu assoreamento e ao seu desmoronamento devido a uma violenta tempestade na segunda metade do século XV (1450-1500) e progressiva degradação. Por volta de 1527 existiam 27 fogos (cerca de 100 habitantes) e dez anos mais tarde apenas 14.
Em 1536 devido à população reduzida dá-se a transferência da paróquia das Paredes para para Pataias.
Paredes desde 1542 ficou quase despovoada e passa por um longo período de esquecimento.
No “Couseiro ou Memórias do Bispado de Leiria” de autor desconhecido, (livro dos finais do século XVI), há uma referência sobre o aparecimento de uma campa, no mar das Paredes, com inscrição em gótico, campa essa que está ou esteve no cemitério das Paredes.
O referido livro do Couseiro alerta que esta vila se despovoou “porque se descobriu grande penedia na baía, com o que não podiam vir a ela embarcações, nem sair dela, e por isto e pelas muitas areias que choviam nas casas e as entulhavam, se despovoou, e ainda se estão vendo muitas ruínas de paredes, posto que quase todas cobertas de areia”.
O despovoamento nunca foi em absoluto porque, os restantes moradores aproveitaram a força dos pequenos riachos que cavaram os profundos e encaixados vales existentes neste troço da costa, instalando moinhos movidos a água (azenhas), havendo notícias das suas instalações pelo pagamento de foros ao Mosteiro de Alcobaça ou à Confraria da Nazaré, entre 1721 e 1812. 
Outras referências ressurgem já em meados do século XIX, na década de 1840, aquando do início da exploração de uma mina de asfalto no Canto do Azeche, lugar da Mina. 
Por volta de 1938, segundo o livro “Pinhal do Rei” de Arala Pinto, o Vale era habitado por 17 famílias, quinze vivendo no casario junto ao mar, e duas mais para montante, onde existiam três azenhas que faziam trabalhar 8 mós. Depois para o interior, no seguimento do Vale, a uma distância de cerca de 500 metros, achavam-se mais 4 azenhas em cada uma das quais vivia uma família.
Neste mesmo livro, Arala Pinto, tece algumas considerações interessantes, descrevendo ele que “do casario do tempo de D. Dinis, restam apenas poucos alicerces, e o agastamento da costa, ao pôr a descoberto o cemitério, originou o aparecimento de vários ossos, alfinetes e moedas da primeira dinastia e de D. João I”. 
“E que junto de alguns alicerces foram encontradas três peças de mobiliário, duas peças de cerâmica e uma candeia de barro. E, no fundo da escarpa, foram encontrados 12 esqueletos no sentido vertical”. 
“Conta-se que perto do sítio da Srª. da Vitória, e onde agora é o mar, que existiu outrora uma Vila conhecida pelo nome de Paredes. O certo é que ainda há bem poucos anos se viam naquelas paragens, sepultadas no oceano, restos de construções e lápides com inscrições romanas, uma das quais existia em poder do Padre Manuel Ribeiro, residente em Pataias”.
Ao longo de todo o século XIX, fruto da instalação no vale de Paredes por Raimundo Costa, que teve 14 filhos, da exploração da mina do Canto do Azeche e do espírito liberal da época, as pequenas veigas aráveis junto ao mar foram ocupadas e cultivadas.



Entre 1920 e 1960 o lugar das Paredes perdeu mais de 30% da sua população, registando um progressivo e significativo envelhecimento associado à redução da natalidade. Neste período a população manteve as suas actividades tradicionais ligadas à agricultura, silvicultura e à moagem dos cereais, numa ocupação intensiva dos terrenos agrícolas entre a praia e os moinhos, situação que se manteve até meados da década de 1990.
O primeiro passo dedicado ao desenvolvimento desta vila deu-se com a abertura, em 1958, da estrada florestal que liga S. Pedro de Moel a Paredes da Vitória, seguindo-se no início dos anos de 1960 a ligação Paredes – Pataias.





MOINHOS DE ÁGUA (AZENHAS) – CAMINHOS DE PATAIAS – OUTROS PONTOS DE INTERESSE 
= OS MOINHOS =

Os registos da existência de moinhos no vale de Paredes remontam ao século XV.
A sua actividade foi então constante prolongando-se de forma irregular até meados da década de 1990, altura em que deixou de laborar definitivamente o último dos moinhos.


Na sua maioria, era feita a moagem de cereais, especialmente o milho. Há registos também da moagem de cimento (cozido nos fornos da Pedra do Ouro), associada a uma pequena serração para o fabrico de barricas.
Identificam-se no vale das Paredes 11 moinhos, correspondendo a um total de 20 mós. De uma forma geral o seu estado de conservação é mau, não existindo nenhum moinho em condições de laborar.
Os moinhos do vale das Paredes distribuem-se em dois conjuntos: 
Um, no núcleo dos “Moinhos” ou “Paredes Velhas”, num conjunto de 6 edifícios e onde se localizava a forja; outro, dispersos ao longo do vale, até à nascente, com cinco edifícios distintos.




Os moinhos desde o fundo do vale até à praia:
1 – Moinho do António Feliciano / Ti Inácia da Farinha
2 – Moinho do Umbelino
3 – Moinho do Esquim do Vale / Toino Manel
4 – Moinho do Toino Manel
5 – Moinho do Fadisca
6 – Moinho do Caixeiro
7 – Moinho da Belmira / Cremilde
8 – Moinho do Figueiredo
9 – Moinho da Botas
10 – Forja
11 – Moinho desaparecido


= OS CAMINHOS DE PATAIAS =

Havia dois caminhos principais vindos de Pataias, que se bifurcavam e interligavam entre si.
A norte da Lagoa de Pataias, o caminho das Paredes, bifurcado no “caminho das moleiras” e na “descida dos castanheiros”, conduzia ao “cruto do vale”, aos primeiros e maiores moinhos, onde se moía milho, trigo e centeio e até cimento. Era o caminho usado preferencialmente por carroças e animais de carga, devido a fugir às dunas dos Outeirões, de difícil transposição.


A sul da Lagoa de Pataias, o caminho dos Outeirões, ou carreiro das bicicletas, bifurcado na “descida do vale” e na “descida dos moinhos”, conduzia aos “Moinhos” (Paredes Velhas) e à praia. Mais directos e mais curtos, eram usados nas deslocações a pé ou por animais de carga.
A estrada florestal, de ligação de Pataias a Paredes da Vitória, é aberta apenas no início da década de 1960, atravessando as áreas de baldios municipais, entregues à gestão dos Serviços Florestais, conhecidas por Alvas.

= OUTROS PONTOS DE INTERESSE =

A fonte dos Castanheiros
As ruínas da Capela de Nossa Senhora do Desterro
A flora e a fauna locais
O antigo porto de Paredes e os canais de rega

Respeitante às ruínas da Capela de Nossa Senhora do Desterro, situadas a meio do vale, reza a história que foi mandada edificar por um fidalgo para servir à população mais empobrecida. A outra, mais antiga, ainda situada no morro, destinava-se para o clero e abastados!...


Nota: Documentação retirada dos livros do “Couseiro ou Memórias do Bispado de Leiria” de autor desconhecido, do “Pinhal do Rei” de Arala Pinto e, “50 anos de ocupação do litoral oeste” de Paulo Grilo.
Compilação e arranjo de texto com fotografias feito por V. Oliveira


2 comentários:

  1. Gostei de ler. Obrigado!
    José Félix

    ResponderEliminar
  2. Vitor, obrigado por esta narrativa histórica. Cumprimentos SS

    ResponderEliminar