terça-feira, 10 de maio de 2022

EU FUI À ROSETE! (1ª. Parte)



A LENDA

A frase cimeira pertence ao refrão de uma música composta e interpretada por um conjunto musical roqueiro do Norte que deu brado nos anos 80 e 90 do século passado se chamavam “Táxi”. Imortalizou essa casa de acolhimento de meninas fáceis, que existiu no Alto da Maia, junto ao viveiro da Picua.

Era novo a noite estava fria
E ninguém sabia o que fazer
Ir p'ra casa com alguns amigos
Ou exp'rimentar prazer
Tudo foi muito bem pensado
Até tomámos uma decisão
Ir tentar a casa da rosete
É o tira e mete que boa diversão
É o melhor p'ra quebrar a tensão
É o melhor p'ra quebrar a tensão
Eu vou exp'rimentar, eu vou exp'rimentar
Eu vou à rosete
Eu vou à rosete
Eu vou à rosete
É uma tentação, mas que tentação
O transporte era o mais difícil
Mas com sorte consegui resolver
O manel, o quim e eu à frente
E os outros foram lá ter
Deparámos com uma casa antiga
Mas ninguém queria ir bater
Ao todo éramos uns sete
Foi a rosete que veio receber
A malta toda estava a tremer
A malta toda estava a tremer
Mas eu vou entrar
Mas eu vou entrar
Eu vou à rosete
Eu vou à rosete
Eu vou à rosete
É uma tentação, mas que tentação
Depois disso já por muito passei
O que lembro não me interessa contar
Só sei que foi tudo tão bom
Eu hei-de lá voltar
Dessa noite não me esqueço mais
Só que disso não podemos falar
Foi na casa da dona rosete
O tira e mete é de chorar por mais
O mete e tira e outras coisas que tais
O mete e tira e outras coisas que tais
Eu hei-de lá voltar, eu hei-de lá voltar
Eu fui à rosete
Eu fui à rosete
Eu fui à rosete
Eu hei-de lá voltar, hei-de lá voltar
Eu fui à rosete
Eu fui à rosete
Eu fui à rosete
Eu hei-de lá voltar, eu vou exp'rimentar
Eu fui à rosete
Eu fui à rosete
Eu fui à rosete é uma tentação, mas que curtição

Eu fui à rosete
Eu fui à rosete
Eu fui à rosete
Vou lá voltar

Ouvir a música: 

Rosete era o nome artístico da dona da casa que se chamava simplesmente Rosa. Esta senhora tinha tido um começo de trabalho efectivo noutra famosa casa “A Micas da Boa”, que funcionou durante muitos anos na Rua de Camões que foi abaixo por motivo de alargamento da Estação da Trindade.
Quando montou o atelier na Maia no fim dos anos 60 recomeçou a actividade, mas já sabia o que queria. Conhecia os hábitos e defeitos das futuras trabalhadoras. Sabia que tinha que ter controle absoluto, disciplinado, com expulsão á primeira discussão e dinheiro vivo, muito. Desta maneira funcionou até á sua morte em 2006.
Como era de esperar, teve que fazer um acordo tácito com a vizinhança. Era uma conhecida benemérita, amiga das boas causas e tinha o apoio camuflado da GNR, que nunca incomodava, mais tarde da PSP. Sabem porquê?

PORQUE O TEMA VEIO Á BAILA ?


Nas sextas-feiras santas, fala-se das viagens gastronómicas, do orgulho de estarmos juntos na Força Aérea mas também da antiga virilidade e a falta dela. Mais uma vez o ensaiador Antonino Neves, lançou o repto a mim e ao Dr. Secas (Adriano Rui). Esta é a minha contribuição, a dele vem a seguir.
Eu não conseguiria escrever qualquer crónica se não me socorresse dos ensinamentos de duas pessoas, grandes conhecedoras da causa Rosetiana. O Sr Lopes, hoje com 86 anos, foi dos maiores frequentadores dos estabelecimentos onde floresceu a Dona Rosa. O outro compincha era o porteiro que trabalhou na Rosete cerca de 20 anos, também até á morte da dona.

Sr. LOPES E A MICAS DA BOA 

Este senhor que faz o favor de ser meu amigo é dono de uma classe extraordinária. Hoje vive desafogadamente e tem um património invejável. Tirou apenas o curso da Escola Industrial Infante D. Henrique. Embora já tenha nascido praticamente rico, não desbaratou os bens herdados dos pais, antes aumentou-os de forma exponencial. Almoço com o Sr Lopes á cerca de 18 anos á terça-feira, quase sempre em Matosinhos na casa Teresa onde o dono é um velho conhecido que me atura há mais de 20 anos, o Rui. 
Durante tantos anos ouvia as histórias dele sobre a ida á Rosete e Maria Augusta, concorrente de 1ª. e só agora pedi-lhe que me relatasse mais pormenores. 
A princípio calou-se, porque pensava que o seu modo de vida camuflado ia ser exposto num jornal ou revista nacional. Acabou por aceder depois de lhe explicar que era apenas uma brincadeira. 
O pai do Sr. Lopes era um conhecido empreiteiro de obras públicas e construção civil, a seguir ao pôs da guerra mundial já tinha máquinas de terraplanagem e extração de pedreiras e britadeiras. Fez trabalhos de restauro e ligação de esgotos para a Micas da Boa. Deixou o filho já rapazola que fosse receber os pagamentos dos trabalhos efectuados, mas já não vinha a quantia certa, pois a dona da casa tinha a arte de seduzir o caloiro e empurra-lhe a Rosinha que viria a ser mais tarde a Rosete. Assim, nasceu uma relação de décadas.

ARMÉNIO PORTEIRO 

Parece pela actividade para que foi contratado uma tarefa fácil, mas não o era. Arménio nunca teve vontade de trabalhar, viveu sempre de expedientes. Era um malandro profissional. Foi croupier de todos os casinos clandestinos do Porto e arredores, que eram muitos. Foi chulo, nunca casou, mas tem ainda quem lhe trata do dia á dia. 
Nunca dava bom dia a ninguém, pois só se levantava de tarde. Solteiro, bem vestido, alto e magro e todos os dias ia ao barbeiro pentear, antes de sair para a night. Nos últimos 20 activos anos abria o portão traseiro da Rosete, onde fazia a pré selecção dos clientes, se os achasse barrulhentos ou bêbados dizia que não tinha lugar. A pensar na gorjeta dizia aos clientes as especialidades das meninas enunciando os nomes. Foi este “operacional “ que me contou os pormenores mais sórdidos e teóricos da actividade da casa.


REGRAS DA ROSETE:


- Idade superior a 21 anos, educadas 
- Corpo escultural e elevado grau de beleza 
- Num grupo de 5 trabalhadoras uma era sempre mais gordinha 
- Hábitos de higiene irrepreensíveis 
- 1ª Tarefa, visita médica no 1º dia 
- Manter-se simpática, sorridente e sem stress 
- Ausência de contactos exteriores durante 2 ou 3 semanas (tempo dos contratos) 
- Ser obediente e ter paciência com a frigidez de alguns clientes 
- Direito a um taxista privativo da casa, que as trazia e as levava também ao médico e no regresso á Estação ou Aeroporto 
- Refeições feitas por cozinheira privativa, mas as trabalhadoras pagavam á parte 
- Quando se portassem mal nunca mais eram requisitadas. 
- Funcionamento das 15 ás 2 da manhã. Descanso ao Domingo 
- O prémio era alto e sem descontos

DIA A DIA

A entrada do estabelecimento era feita por um portão traseiro alto, com uma campainha alta para afastar crianças. Em frente tinha um cruzeiro e uma oficina de automóveis, ao lado um marmorista, que serviam de desculpas a quem fosse apanhado na zona. Eram atendidos pelo Sr. Américo ou pela Sr. Maria, que também fazia limpezas e tratava da lavandaria. Estabeleceu-se a disponibilidade da clientela ou ia para a sala de espera ou baixava nas escadas, para não se verem uns aos outros, o que nem sempre era possível. 
A classe dos clientes podia prever segundo a indicação da patroa, os mais assíduos ou amigos da Rosete esperavam no reservado. 
Os clientes tradicionais, viam desfilar as meninas disponíveis, que se não as conhecessem podiam lembrar-se das dicas dos porteiros para conferir as especialidades. Era também necessário não esquecer o nome da gordinha pois se se enganasse uma vez de levar uma boneca para o quarto, acabava por ter uma trabalhadora forte e depois vinha aquela pergunta sacramental, gosta das mais gordinhas? 
Havia o estatuto de clientes do reservado, ganhou essa aureola pelo conhecimento público ou por habituação e a confiança depositada pela gerência. 
Ficaram celebres dois deputados bem conhecidos do público, um catedrático da esfera de um partido de topo, que vinha de Lisboa de avião, era transportado no táxi do Sr. Fernando, entrava pela frente era bem tratado e retomava o aeroporto. Era extraordinariamente porco, pois recomendava a não lavagem da menina escolhida. Outro deputado desde a Assembleia constituinte de 1976 que era companheiro de Álvaro Cunhal, mas desentenderam-se na guerra entre os dogmáticos e os moderados, em que a saída mais visível foi a da Rita Seabra. Este senhor ainda é vivo e passeava há poucos anos no litoral algarvio. 
No reservado, a alguns era servido, um café, um whisky e mimos. Podia-se falar com a Dona Rosa, boa conversadeira e sabedora.

Fim da 1ª parte 

Toneta, Abril de 2022


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