terça-feira, 8 de junho de 2021

MIGUEL TORGA


O Homem, o Escritor, o Tempo, a Terra e a Democracia!...

Adolfo Rocha – Infância e Juventude – 1907 a 1933

“Ter um destino é não caber no berço onde o corpo nasceu, é transportar as fronteiras uma a uma e morrer sem nenhuma.”

Miguel Torga, Pseudónimo de Adolfo Correia Rocha, nascido em S. Martinho de Anta em 1907 e falecido em Coimbra em 1995.

“Nasci como um cabrito ou como um pé de milho.”

“O destino plantou-me aqui e arrancou-me daqui. E nunca mais as raízes me seguraram bem em nenhuma terra.”

Em 1917, aos dez anos, vai para uma casa apalaçada do Porto, habitada por parentes da família.
O pequeno criado ganhava quinze tostões por mês e dormia num cubículo de campainha à cabeceira.
Fardado de branco servia de porteiro, “moço de recados”, regava o jardim, “limpava o pó e polia os metais da escadaria nobre”, “atendia campainhas”.
Foi despedido um ano depois, devido à constante insubmissão.
Em 1918 vai para o Seminário de Lamego, onde viveu “um dos anos cruciais” da sua vida, tendo melhorado os conhecimentos de português, de geografia, história, aprendido latim e ganhado familiaridade com os textos sagrados.
No fim das férias comunicou ao pai que NÃO SERIA PADRE.

A GRANDE AVENTURA JUVENIL EM 1919



Foi então enviado, aos doze anos, para o Brasil (Minas Gerais), a fim de trabalhar numa fazenda que pertencia a um tio, fazenda de Santa Cruz.

“Simples máquina de trabalho…era o último a deitar-me e o primeiro a erguer-me, sem domingos nem dias santos para que a engrenagem funcionasse com perfeição.”

Carregar o moinho, mungir as vacas, tratar dos porcos, ir buscar os cavalos da cocheira ao pasto, limpá-los e arreá-los, rachar lenha, varrer o pátio e atender a freguesia que vinha comprar fumo, cachaça, carne seca, feijão, ou trocar grão por fuba; ir buscar o correio à povoação; fazer a escrita da fazenda, verificar à noite se as portas e as janelas estavam bem fechadas.

Quatro anos decorridos o tio matriculou-o no Ginásio de Leopoldina.

Em 1925, na convicção de que ele havia de vir a ser “doutor em Coimbra”, o tio propôs-se pagar-lhe os estudos como recompensa dos cinco anos de serviço.

“Crescera por fora e por dentro. Aprendera a objectivar a vida, embora sempre tivesse sentido aquele chão como fabuloso e mágico e aonde pudera ser selvagem e natural.”

Um dos seus títulos de glória é ter passado a adolescência no Brasil.

“O Brasil amei-o eu sempre, foi o meu segundo berço, sinto-o na memória, trago-o no pensamento.”

De regresso a Portugal, fez em dois anos, os cinco do primeiro e segundo ciclo do curso liceal de sete.

No Liceu José Falcão completou o terceiro ciclo num só ano, ficando apto a cursar uma Universidade.

Em 1928 Adolfo Rocha estudante universitário da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. 
A caneta que escreve e a que prescreve revezam-se harmoniosamente na mesma mão.

Golpe militar de 1926

A intervenção literária, já então a entendia Adolfo Rocha, como o único modo de combate. “Numa pátria que é o cemitério da própria língua.”

Conclui o curso universitário em 1933. “Na hora em que esperava merecer da vida a alegria íntima do triunfo, sinto o medo do avesso quiçá o terror fundo que não diz donde vem nem para onde vai”, anotou no dia da formatura.

A VIDA OBJECTIVA, A ÚNICA QUE VALE A PENA



Casa com Andrée Crabbé em 1940, estudante de nacionalidade belga – aluna de Estudos Portugueses ministrados por Vitorino Nemésio em Bruxelas – que viera a Portugal para frequentar um curso de férias na Universidade de Coimbra.

“Vou tentar ser bom marido, cumpridor – mas quero que saibas, enquanto é tempo, que em todas as circunstâncias te troco por um verso.”


ADOLFO CORREIA ROCHA, AOS 27 ANOS EM 1934, AUTO DEFINE-SE PELO PSEUDÓNIMO QUE CRIOU

MIGUEL E TORGA

MIGUEL – Homenagem a dois grandes vultos da cultura ibérica: Miguel de Cervantes e Miguel de Unamuno.

TORGA – Designação nortenha da urze, planta brava da montanha, que deita raízes fortes sob a aridez da rocha, de flor branca, arroxeada ou cor de vinho.

Em 1940 escreve os contos “Bichos”, em que os animais se apresentam com um sentir humano ou seres humanos vestidos de animais. Ou uma irmandade de animais e homens. Tudo numa argamassa de vida. O cão Nero, o galo Tibério, o jerico Morgado, o Ladino, o Ramiro. E a Madalena, caminhando na contra mão da contradição entre cultura e vida.



Jorge Amado escreveu: “Se existe alguém que escreve em português e merece o Nobel é Miguel Torga.”

Torga, escreve: “Hoje sei apenas gostar duma nesga de terra debruada de mar.”

Sobre a descolonização escreveria: “Fomos descobrir o mundo em caravelas e regressámos dele em traineiras. A fanfarronice de uns, a incapacidade de outros e a irresponsabilidade de todos deu este resultado: o fim sem a grandeza de uma grande aventura. Metade de Portugal a ser o remorso da outra metade.”

“O Homem é, por desgraça, uma solidão: Nascemos sós, vivemos sós e morremos sós.”

Em 17 de Janeiro de 1995 morrem o médico Adolfo Rocha e o poeta Miguel Torga. Ambos repousam, sob uma única laje, em campa rasa no cemitério de S. Martinho de Anta.


A MORTE

E o Poeta morreu.

A sombra do cipreste pôde enfim

Abraçar o cipreste.

O torrão

Caiu desfeito ao chão

Da aventura celeste.

Nenhum tormento mais, nenhuma imagem

(No caixão, ninguém pode

Fantasiar)

Pronto para a viagem

De acabar.

Só no ouvido dos versos,

Onde a seiva não corre,

Uma rima perdura

A dizer com brandura

Que um Poeta não morre.


Notas: Diaporama de Luís Aguilar e Vitália Rodrigues. Concebido a partir do livro Fotobiografias de Clara Rocha.

Compilação e arranjo feito por V. Oliveira


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