As mulheres negras (livres e escravizadas) compunham o grupo mais numeroso da população. Enquanto algumas nasceram em Luanda, outras migraram para a cidade em busca de melhores oportunidades num porto que era também o centro administrativo da colónia. Esse foi o caso da negra livre Maria Joaquina, natural da Barra do Bengo, que vivia em Luanda onde ela veio a falecer em 25 de outubro de 1854, aos 40 anos de idade. A cidade também atraía mulheres provenientes de regiões distantes, como Delfina António, procedente do Reino do Congo, que também faleceu em Luanda no mesmo ano, aos 40 anos.
A maioria das negras livres era pobre, habitando cubatas ou casas cobertas de palha espalhadas pela cidade – apesar da oposição de outras camadas da população. Muitas negras livres constituíram famílias com negros também livres, com quem mantiveram uniões informais ou celebradas “à moda do país”. Ainda que alguns desses negros e negras livres professassem o Cristianismo, especialmente aqueles nascidos em Luanda, a burocracia e valor monetário de um casamento Católico impediam os mesmos de oficializarem as suas uniões. De qualquer modo, dessas relações informais nasceram filhos naturais, que foram baptizados na Igreja Católica. Em 31 de outubro de 1817, João, foi baptizado como filho natural de Lívia Francisco e Joaquim de Santa Ana, ambos negros livres. Em maio de 1818, os negros livres Paulo Gaspar e Cristina Manoel baptizaram a filha natural ,Maria, na Igreja dos Remédios. Apesar de não serem casados na Igreja, estes casais reconheciam a importância do baptismo numa sociedade luso-africana e escravocrata.
Diante da insegurança gerada pelo tráfico de escravos, sinais de pertenca à comunidade luso-africana, podiam demarcar a diferença entre escravidão e a liberdade. Durante a era do tráfico transatlântico de escravos, as populações que viviam em áreas sob controle português, que falavam português e professavam o Cristianismo , estavam teoricamente protegidos contra a escravidão . Logo, ao baptizar os seus filhos, africanos livres, estavam também a tentar protegê-los, do risco iminente da escravização.
Numa sociedade escravista, homens e mulheres de pele escura viviam em situação de vulnerabilidade. Em abril de 1866, a negra Rosa foi vítima de duas tentativas de escravização por parte do negro de nome Manoel, morador de um musseque no subúrbio Palanca, fora dos limites urbanos da cidade. O curador dos escravos e libertos intimou Manoel a prestar esclarecimentos acerca do caso apresentado por Rosa. A posse de uma escrava significava mão de obra extra para cultivar a terra e realizar as tarefas domésticas. Manoel podia ainda empregar Rosa como quitandeira para vender o excedente de sua produção nos mercados e ruas da cidade. Ele também podia optar por vendê-la no mercado local. Entre as décadas de 1850-1860, o preço do escravo em Luanda era de cerca de 20.000 réis.
Negras livres também entraram em relacionamentos temporários ou de longo prazo com homens brancos, dos quais nasceram filhos naturais. Do relacionamento entre o português Francisco de Assis Pereira e a negra livre Constância Maria, nasceu uma filha natural chamada Maria, que faleceu aos dois anos de idade. Maria foi sepultada na Igreja dos Remédios, no dia 27 de dezembro de 1852. O comerciante de origem portuguesa Francisco de Assis Rocha Caldeira teve um filho natural chamado Manoel Duarte, com a negra livre Felipa. Em 26 de abril de 1853, Manoel faleceu aos dois anos de idade, sendo sepultado na mesma igreja. As mulheres que entravam em uniões informais não herdavam os bens deixados pelos seus companheiros quando estes faleciam. Cabia a eles fazerem provisões em seus testamentos para que os seus filhos naturais e companheiras informais fossem beneficiados.
Negros livres podiam adentrar oficinas como aprendizes para se tornarem oficiais e mestres artesãos, adquirindo assim um ofício. As mulheres, porém, eram excluídas desses espaços Muitas negras livres encontraram oportunidades como quitandeiras no comércio a retalho das ruas e quitandas, como os mercados eram conhecidos em Angola. Em 1853, a negra livre Maria Diogo vendia fazendas pelas ruas da cidade. Outras ofereciam serviços à população urbana como carregadoras de água, lavadeiras e costureiras. Numa cidade portuária que frequentemente recebia marinheiros e capitães de embarcações, algumas negras livres devem ter adentrado a prostituição. Embora não haja registros da existência de bordéis em Luanda para esse período, as tavernas atraíam uma clientela predominantemente masculina em busca de bebidas alcóolicas, jogos e, possivelmente, companhia feminina .Uma pequena minoria entres as negras livres conseguiu acumular algum pecúlio após anos de trabalho, investindo na aquisição de pequenos lotes de terra ou moradia. A negra Emericiana Francisca, por exemplo, era proprietária do arimo Calui, no Distrito do Dande, com 60 braças de frente. Em setembro de 1855, Emericiana vendeu o arimo a Dona Ana Luísa Mangueira por 45.000 réis. Em abril de 1866, a negra Tereza Emília da Costa comprou uma casa térrea de dois quartos, na rua do Pelourinho, pelo valor de 124.000 réis. Todavia, Emericiana e Tereza eram excepções. A maioria da população negra habitava cubatas simples e tentava, através do seu trabalho, arrecadar o suficiente para sobreviver com as suas famílias.
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