terça-feira, 24 de março de 2020

A SINGULAR CASA DOS BICOS


Em 2012 a Fundação José Saramago, famoso escritor e prémio Nobel português, instalou-se neste emblemático edifício da cidade, único no género. 
Situado no bairro da Sé, junto ao Campo das Cebolas, esse edifício é mais conhecido como Casa dos Bicos e é o mais estranho edifício civil da Baixa lisboeta cuja origem muitos procuram saber ao admirarem-se com a sua fachada de bicos singular no património arquitectónico da cidade e muito rara no país. Trata-se de um palácio quinhentista reflectindo a forte influência dos ideais divulgados pelo Renascimento e ainda uma certa mudança de mentalidade durante a época Manuelina, na sequência dos Descobrimentos Marítimos. 
A data da sua construção terá sido por volta de 1523, após o regresso de Itália, em 1522, do nobre rico e viajante D. Afonso Brás de Albuquerque (1501-1581, filho primogénito do vice-rei da Índia, D. Afonso de Albuquerque). Nas suas viagens por esse país, teria conhecido o palácio de Bevilaequa, em Bolonha, e o Palazzo del Diamante, em Ferrara. Ao construir a sua casa com a fachada em pedra talhada em pirâmide ou “ponta de diamante”, esta foi marcar uma forte rotura com os outros palácios da Ribeira de Lisboa. No entanto, o desenho da fachada não seguiu à risca o programa em voga na Europa, quanto ao desenho octogonal na abertura dos vãos e a utilização de uma métrica no desenho da fachada, pois que foram os valores e necessidades funcionais do interior e a sua significação que determinaram os tipos de aberturas no exterior.

Este palácio quinhentista ergueu-se sobre edifício recuando ao período romano, cujos vestígios, postos a descoberto nos anos 80 do século XX, hoje podem ser vistos no seu interior. Dentre os vários elementos líticos, além de 5 tanques para salga e conserva de peixe usados pelos romanos, destaca-se uma base de capitel em estilo coríntio, o lintel de uma porta, a parte superior de uma ara e um troço de marco milenário dedicado ao imperador Marco Aurélio Probo (276 a.C. a 282 d.C.), que deveria assinalar a passagem de uma via entre a actual Casa dos Bicos e a Sé, possivelmente sendo a que se dirigia a Scallabis (Santarém). 
O espólio recolhido abrange desde o século I a. C. até ao início do século IV d.C. A fábrica de salga e conserva de peixe terá sido desactivada no final do século III ou no começo do IV, na sequência da construção da muralha defensiva de Olisipo (Lisboa), já que aquela ficaria intramuros. Os vestígios romanos dessa fábrica, a estrutura semicircular acossada à Cerca Moura, parte da torre medieval e o pavimento mudéjar, conduzem o visitante numa fascinante e singular viagem, dentro da Casa dos Bicos, por distintos períodos da História de Lisboa, e tem ainda a rica biblioteca e as exposições de pintura da Fundação José Saramago para o deliciar mais. 



Nota: Recolha feita por V. Oliveira

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