sábado, 23 de novembro de 2013

CIRCUNCISÃO ENTRE OS GANGUELAS


O ritual tem lugar numa clareira natural – Bamba – usada para o mesmo fim por gerações. De um lado ficam as cubatas que vão servir de moradia aos Kimbandas – o feiticeiro chefe do ritual, o operador, o intérprete dos espíritos e os ajudantes. Depois vêm diversos semi-cercados, sem qualquer espécie de proteção e que servirão de habitação aos iniciados durante o tempo que durar o ritual e Escola da Vida – Mukanda Kandongo.

Na véspera do dia marcado para a cerimônia, realiza-se no Sobado um batuque de comemoração pelo início do ritual, em que os rapazes que vão participar, mais do que ninguém, dançam até à exaustão.
O esgotamento físico por esta noite, junto com os efeitos do Marufo – fermentado de seiva de palmeira – são os únicos anestésicos para o dia posterior.
Quando rompe a madrugada, o Kimbanda chefe põe fim ao batuque e declara aberta a Mukanda Kandongo.


Os jovens participantes são então pintados de branco, perdem os nomes de criança e recebem todos eles o nome de Fungandas.
Os Fungandas dão a seguir entrada na clareira sagrada, onde permanecem sentados, lado a lado, tendo cada um junto de si um ajudante de Kimbanda.
O Kimbanda dirigente evoca então os espíritos auxiliado pelo pelo rufar dos batuques, e após, o Kimbanda operador, munido de todos os instrumentos e amuletos, dá início às operações de corte dos prepúcios.
O ajudante segura fortemente o Funganda, enquanto tenta incutir-lhe no espírito o orgulho de homem, para ajuda-lo a suportar as dores.
Após o corte, o sangue é estancado e a ferida envolvida por uma mistura de ervas e outras substâncias cicatrizantes, cinzas inclusive, em algumas tribos é usado também o estrume vacum, e o pênis envolvido por folhas que o isolem do contato com as pernas.
Terminada esta parte, o Kimbanda intérprete dos espíritos declara o funganda operado “homem”, e deixa-o ir para a Mwela – cercado – que lhe é destinada, onde se completará a cicatrização.
Na mwela sofrerá durante o período de cicatrização, as intempéries, pois este sofrimento vai ajuda-lo a preparar-se para os maus momentos da vida.
Durante o período de cicatrização, ficam imobilizados em posição quase letárgica, e assim, são alimetados pelos ajudantes do Kimbanda, que também os ajudam a satisfazer as suas necessidades fisiológicas.

A segunda parte da Mukanda começa a partir da completa cicatrização.
Os fungandas que resistirem a esta primeira fase – muitos morrem de septicemia – podem então levantar-se, limpar as Mwelas e entram então já homens na fase de aprendizado da vida.
Exercitam o corpo em provas de corrida, aprendem a usar a lança e a zagaia, é-lhes ensinada a técnica da espera e avanço para o bom êxito da caçada, a paciência para a pesca, e as tradições tribais, que jamais devem ser menosprezadas.
Durante esta segunda fase, são freqüentemente postos à prova, em situações em que tenham que demonstrar coragem e tenacidade, e têm se subsistir por eles próprios, pela caça e pesca.
O sentimento que mais lhes é incutido, é o de camaradagem pelos companheiros da mesma Mukanda; o ritual os irá irmanar pelo resto da vida.
Chegados ao fim da segunda parte da Mukanda, os Fungandas escolhem o nome de adultos, normalmente de um animal que tenham abatido e que lhes tenha causado particular orgulho. Começa aí a terceira fase.

Na terceira e última fase, têm especial destaque os Kimbandas intervenientes dos espíritos, pois estes são os verdadeiros mestres das coisas da vida. Cada Kimbanda tem nessa terceira fase, um aspecto da vida a ensinar; desde o Kimbanda que ensina os segredos e mistérios do amor, incluindo as artimanhas femininas, até noções de justiça e vícios a evitar.
Com o fim dos ensinamentos, é chegado o fim do ritual – que chega a durar meses -- e os novos homens saem para o banho sagrado de purificação e preparam-se para os rituais de despedida.




Na última noite são entoados cânticos alegres, feitas juras de segredo pelo que ali aconteceu, e recebidos os últimos conselhos para a vida.
No dia seguinte, logo ao raiar do sol, tem lugar a cerimônia mais comovente de toda a Mukanda, que é o enterro dos Fungandas que não resistiram às provas.
Os cadáveres são descidos dos ramos de árvores onde hajam sido colocados, e desenrolados das folhagens que lhes serviam de mortalha, para que os novos homens, antes de entrarem na vida, tomem mais uma vez contato com a morte.
Em seguida são novamente amortalhados e, ao som de um batuque fúnebre, enterrados perto das Mwelas que lhes pertenciam.

Quando esta cerimônia chega ao fim, já todas as sanzalas – aldeias – receberam a notícia do fim da Mukanda. Vão então homens e mulheres, em sinal de júbilo, esperar os ex-Fungandas.

À chegada à sanzala, segue-se um batuque de comemoração; é uma noite alegre, onde só se vê tristeza, nas mães que perderam os filhos durante o ritual..

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